Todas as Vozes

Porque é preciso
penetrar no intervalo silencioso e raso
entre o sonhado e o possível
         e fazer música.
Todas as vozes. nenhuma — tantas
essa inclusive. antiga
a repetir palavras
desalinhadas no tempo
e outras 
desafinadas. rudes
agudas demais. graves de menos
apáticas. dramáticas. ingênuas
Babel interior
murmúrios carpideiros
Onde? a voz privema se perdeu
e quando? 
Por que tanta palavra
se só — no silêncio me encontro?
A voz pequena que andou calada
ou sufocada
pelo infernal mormaço
agora canta.
Se desprendeu
do peso da matéria.bruta
e canta brumas.
Enquanto sopra
folhas de dente-de-leão no vento. 
As vozes se unem como num mantra
tão antigo quanto a lua
e os uivos/dos lobos/dos homens
pois tudo canta
ainda que
ruídos
tentem nos impedir
e o lento e áspero arrastar–se
das horas
(cálices de silêncio e absinto)
pedras que se atiram no lago/lodo
onde toda palavra mergulha e sufoca
:se não cumprida sina.
A noite está repleta de vozes
vindas de dentro
do coração.

Ouço nitidamente uma canção.
A voz latente tenta se libertar
do fosso-nada em que habita.

Quando consegue, cria asas e voa.

Palavra-livre que ninguém
aprisione. Sequer um ‘cale-se’.
Vozes vindas da alma, das profundezas 
(invenções e memórias)
revérbero de vozes mais antigas
repercute o poema
quando bate nas pedras

— e canta.